por Eduardo Aroso
Um outro exemplo de não
oposição ciência/religião está no seguidor de Galileu, Newton. Nos últimos anos
da sua vida dedicou-se intensamente aos estudos de numerologia que vislumbrava
na Bíblia. O cientista da Lei de Atracção Universal na 2ª edição dos «Principia»,
sobre a origem não mecânica do Universo, diz o seguinte: «Este sistema notável
do Sol, dos planetas e dos cometas só poderia provir das intenções e da energia
de um ser inteligente e poderoso», apesar de Newton se ter recusado receber
Ordens Sacras (hábito naquele tempo) quando se candidatou à Universidade de
Cambridge.
«Depois da descoberta, na década de 1930, de um grande volume de manuscritos de Newton sobre assuntos de alquimia que haviam passados despercebidos depois da sua morte, a faceta alquimista de Newton não pode deixar de ser tida na devida consideração quando se pretende estudar a sua posição e matérias do domínio da química. Deles se depreende que Newton dedicou um tempo imenso à alquimia, provavelmente maior do que à mecânica» (Amorim, obra citada, pág 80). Por estas e quiçá outras facetas da sua vida, foi apelidado de “o último dos magos e o primeiro dos físicos”.
Outro tema que implica religião e ciência é o das transfusões de sangue, e que tem vindo a conhecer grande dimensão. É sabido que no domínio da hematologia e similares tem havido grandes progressos. A religião não analisa nem estuda o sangue, todavia há muitas alusões a ele na Bíblia. Alusões veladas que o esoterismo desvela como é o caso do que nos diz Max Heindel em «Princípios Ocultos de Saúde e Cura». Os grupos sanguíneos são um prenúncio de que no futuro dar sangue a outra pessoa pode ocasionar uma rejeição total ou então pelo menos ter alguma influência oculta em quem recebe, o que pode ser um entre outros episódios da nossa vida dos quais não descortinamos o sentido. M. Heindel diz todavia que «presentemente estamos no início desta individualização do sangue e, portanto, é possível injectar sangue de um ser humano noutro. Mas em breve isso será impossível. (…) O ego estará demasiado individualizado para poder agir no sangue não gerado por si mesmo». Assim, o facto do ser humano ser cada vez mais individualizado, já está a desencadear a chamada “engenharia genética”, através da qual o sangue e órgãos podem ser gerados a partir da própria pessoa. As células estaminais constituem um novo horizonte.
M. Heindel afirma várias vezes que «o sangue é a mais alta expressão do corpo vital». Estando neste último o início de qualquer desenvolvimento oculto, nomeadamente pela repetição, é fácil perceber que a Bíblia faça várias alusões ao sangue, embora em níveis diferentes. Num sentido literal temos, por exemplo, o sangue no contexto em que S. Paulo fala: «a carne e o sangue não herdarão o reino dos céus»; ou afirmações de “índole guerreira” sobretudo do Antigo Testamento, em que o sangue está conotado com a força física e o «espírito de raça». Só o cristianismo esotérico como o difundido pela Fraternidade Rosacruz (veja-se o Conceito Rosacruz do Cosmos, cap XV) pode trazer luz ao entendimento do Sangue derramado por Cristo no Gólgota, ou noutra passagem quando Cristo diz aos apóstolos na Última Ceia: «Bebei dele [o cálice] todos, pois isto é o meu sangue, o sangue da Aliança». Não faria qualquer sentido que essa Aliança fosse celebrada com o sangue (aqui vinho líquido) em vez do “vinho etérico”, (vinho místico) ou comunhão com o etérico, até porque sabemos que a Sua última vinda será em corpo vital. Sentido semelhante podemos encontrar no Apocalipse na seguinte passagem: «a mulher que está embriagada com o sangue dos santos».
O cientista rosacruz J. B. van Helmont (1579-1644), citado no Conceito Rosacruz do Cosmos, estudou teologia e filosofia na Universidade de Lovaine, mas desiludido com a carreira académica, voltou-se para estudos médicos, químicos, fisiológicos e de fitoterapia. Na pegada de Paracelso, defendia que «a vida – que comparava com o fogo e a luz – está contida no sangue arterial». Aqui podemos ver a semelhança com o que diz Max Heindel. Quanto à ciência, como foi dito, tem sido muito importante no estudo do sangue, mas como sempre acontece com o conhecimento meramente académico, a relação espírito/forma fica sempre incompleta, ou seja, a individualização do ser humano requer um aperfeiçoamento proporcional da forma (corpo), e essa relação causa-efeito ainda não entrou resposta nos corredores dos laboratórios.
O cientista neurologista português António Damásio, a trabalhar nos USA, na sua última obra «A Estranha Ordem das Coisas», editora Temas e Debates – Círculo de Leitores, 2017, não saindo do seu cânone de cientista, pelo que desenvolve e demonstra não deixa contudo de nos fazer pensar na Vida de um modo mais holístico. Ou seja, o autor na sua linguagem científica vai contudo remetendo o leitor para outros conhecimentos dos quais, na verdade, o Homem tem sido o agente ao longo de muitas épocas, tais como a arte e a religião, caminhos diferentes mas que no fundo, por encontrarem eco no ser humano, estão na sua essência e em última análise na divindade de onde procedem. No primeiro capítulo da obra citada Damásio diz o seguinte: «As ciências, por si só, não podem iluminar a experiência humana sem a luz que provém das artes e das humanidades». É digno de observação as palavras que utiliza como «iluminar» e «luz», ou seja, um eminente investigador que ultrapassa já a ideia cartesiana de ciência. Sem pretender um resumo do que na verdade não se pode resumir, os conteúdos do livro, pode-se dizer que uma das linhas essenciais trata da função soberana dos Sentimentos e do alcance que sempre tiveram em toda a organização da vida do ser humano desde épocas remotíssimas. Reagindo, positiva ou negativamente a estes, o ser humano foi estruturando as sociedades, os códigos, as condutas, etc. Damásio trata exaustivamente o conceito de «homeostasia», indo muito além da homeostasia clínica habitual. Consiste ela não só na função do ser se auto-regular a todo o custo a si mesmo, mas também, note-se, de fazer com que a vida se reproduza e expanda, sendo que a morte é apenas uma interrupção desse processo natural, ou, como sabemos pela filosofia rosacruz, fazendo parte dessa expansão (evolução). «A nossa mente a nossa cultura estão ligadas aos meios e recursos da antiga vida celular». Aqui vemos a unidade da Vida. Eis o esforço para explicar o mistério da Vida, situação difícil para qualquer conhecimento. «Não vejo as religiões como meras respostas terapêuticas» (…) «A questão da crença religiosa é de facto importante. O efeito homeostático positivo da crença religiosa pode ser documentado individualmente».
A arte dá-nos visões complementares tal como a religião quando nos falam de beleza, proporção, esforço, sentimentos fraternos e amorosos, triunfo do bem final, a indivisibilidade de Deus, etc que nos iluminam mais. Ao lermos outra passagem, informa-nos sobre o corpo num sentido holístico: «faz parte de um organismo composto por sistemas cooperativos, compostos por órgãos cooperativos, compostos por células cooperativas, compostas por moléculas cooperativas, compostas por átomos cooperativos criados a partir de partículas cooperativas». Um grau extraordinário de cooperação no campo estrito da Biologia e que, num plano diferente, nos faz lembrar também a cooperação das Hierarquias Criadoras e de todas as Ondas de Vida com os seus inúmeros seres em diferentes graus evolutivos, mas trabalhando na Grande Obra, a Obra da Criação.
Na presente época, por um lado tem-se acelerado a chamada especialização e por outro uma revivescência do antigo conceito helénico de «holos» (o todo), dando lugar, por exemplo, à chamada medicina holística ou a uma psicologia que estuda o ser humano de um modo mais abrangente. A enorme quantidade de conhecimento na actualidade é mais uma convergência do que uma encruzilhada, embora a maioria da humanidade ainda se sinta confusa na encruzilhada, talvez por não saber que é convergência. Há muito caminho a percorrer. Aspiremos ao auxílio incalculável dos Irmãos Maiores da Rosacruz.
Parte 1 deste artigo: (aqui)
Eduardo Aroso é Probacionista da The Rosicrucian Fellowship através de Portugal.
Mais artigos do autor neste blog: (aqui)
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Em outros sites:http://eduardoaroso.centrorosacruz.net/ea_011.htm e
Imagem: " Educação " (1890), vitral de Louis Comfort Tiffany e Tiffany Studios, Universidade de Yale . Fonte Wikimedia Commons.