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A Ùltima Ceia - William Blake |
por Gilberto Silos
Os Evangelhos, muito mais que um conjunto de quatro narrativas sobre a vida de Jesus de Nazaré, são diferentes sistemas de iniciação cristã. As “Bodas de Caná”, por exemplo, relatadas no Capítulo 2 de João, fazem parte desse conjunto. Não se trata de uma simples cerimônia de casamento, mas de uma alegoria ao matrimônio místico do Eu Superior com o eu inferior
Foi nesse evento bíblico que Cristo “transformou a água em vinho”. Isso pode intrigar a mente dos estudantes do esoterismo cristão. Afinal não se aconselha o aspirante à vida superior a abster-se de tabaco, carnes e bebidas alcoólicas?
O vinho era o elemento simbólico da Antiga Dispensação, prevalecente na época jeovística. Com o advento da Época Ariana ele substituiu a água, até então utilizada nos templos de iniciação da Atlântida.
Até meados da Época Atlante o espírito humano não era plenamente consciente de seu corpo físico e muito menos do ambiente que o rodeava. Sua consciência estava enfocada nos planos espirituais.
Um novo ciclo deveria iniciar-se, em condições tais que o espírito pudesse aprender as lições pertinentes ao mundo material. Para fazê-lo deveria esquecer sua origem espiritual e concentrar seus esforços na nova realidade que se lhe descortinava. Com esse propósito, as Grandes Hierarquias introduziram o vinho em sua dieta, como fator capaz de obscurecer-lhe a memória de sua origem divina e dos mundos que conhecia.
A conquista do mundo material faz parte do plano de evolução da raça humana. As antigas religiões ensinavam a Doutrina do Renascimento. Deixavam claro a seus seguidores que o progresso do ser humano se realizava por meio de experiências vividas em sucessivos corpos, em tempos e contextos diferentes. Não havia, então, necessidade de acelerar o processo evolutivo, pois tudo ocorreria de forma natural e orgânica. Isso pode ser coerente com o pensamento oriental, mas não com a natureza mais dinâmica dos povos do Ocidente.
Diante dessa realidade, as Hierarquias Divinas utilizaram o vinho como meio para apagar da memória do homem o fato dele renascer periodicamente em corpos diferentes e da existência dos planos invisíveis da natureza. Dessa forma, na Antiga Dispensação a água era utilizada nas cerimônias dos templos, mas o vinho passou a ser consumido em larga escala pelo homem comum.
O vinho, resultado da putrefação e fermentação do fruto da videira é um espírito. Os gregos lhe deram o nome de Baco, donde o termo bacanal para designar as orgias regadas a bebida e sexo na antiguidade. Com o advento do cristianismo inaugurou-se uma nova Dispensação. Esse sistema iniciático não comportava mais o uso da carne e principalmente do vinho na dieta humana. Assim foram instruídos os primeiros iniciados da Dispensação Cristã. Nas Bodas de Caná, ao transformar a água em vinho o Cristo estava apenas mantendo a ordem até então vigente.
Entretanto, para muitos ainda parece contraditório o fato de Cristo ter celebrado com vinho a Última Ceia. Não há fundamento bíblico para tal suposição. Os relatos evangélicos não a confirmam. Segundo Lucas e Marcos, Cristo incumbiu a seus mensageiros de irem a certa cidade buscar um homem que carregava um cântaro com água. Nenhum dos Evangelhos afirma ser vinho o seu conteúdo. E, segundo Max Heindel, a investigação na Memória da Natureza revela o uso de água e não de vinho.
O emprego da água na Última Ceia harmoniza-se astrologicamente com o início de uma nova Era. Por precessão o Sol já se encontrava nos últimos graus de Áries, e seu próximo trânsito seria pelo signo aquático de Peixes.
Manifestava-se um novo tempo, onde os ideais mais elevados seriam simbolizados pelo pão e pela água, evidenciando, assim, a relação Peixes-Virgem. Na Santa Ceia, Cristo partiu o pão, feito do grão imaculadamente gerado, diferente da carne que alimenta as paixões.
A Igreja Católica oferece aos seus fieis a água benta na entrada do templo e o pão no altar, no momento da comunhão.
O cálice oferecido à humanidade quando dos primórdios da época Ariana não continha a essência da pureza. A palavra pronunciada pelo ser humano tornou-se um conjunto de sons desprovido de vida e energia.
Quanto ao cálice da época futura, a Nova Galileia, ele será um órgão etérico formado na cabeça e na garganta, gerado pela força sexual não utilizada. À visão espiritual, aparece como a haste de uma flor ascendendo desde a parte inferior do tronco. Será um órgão criador, capaz de pronunciar a palavra de poder e infundir vitalidade em formas inertes.
O órgão mencionado pode ser construído por meio do serviço amoroso e desinteressado e pela pureza de vida. É uma prerrogativa daqueles que abraçam a vida superior, atuando durante a noite como Auxiliares Invisíveis, estando fora do corpo. É quando se ensina a “palavra de poder” com o propósito de regenerar tecidos e sanar enfermidades.
Com o passar do tempo a perspectiva é de rejeição gradual do vinho por parte do ser humano, sensibilizando sua consciência e o despertando do longo “sono letárgico” provocado por essa bebida. Paulatinamente recobrará a memória de sua origem e de sua herança divina.