12/03/2011

Fazer Grandemente as Coisas Pequenas


Desde que de mim recordo, nos remotos horizontes da vida, tive imenso desejo de fazer algo de grande, algo que saísse da rotina geral da cômoda mediocridade, algo que lançasse uma esteira de luz através das noites da humanidade, algo que valorizasse a minha passagem pela terra e desse uma razão de ser à minha vida. Só Deus sabe quanto tenho suspirado por essa grande alvorada, em que eu pudesse fazer algo de grande, mas, a minha vida, era feita toda de coisas pequenas como ordinários seixinhos, brancos, cinzentos e pretos, na poeirenta estrada de meu monótono viver, por onde transitava o tropel das banalidades anônimas.

E eu fazia com pequenez essas coisas pequenas da minha rotina cotidiana, fastidiosa e incolor... e continuava a suspirar pelo grande acontecimento que valorizasse com sua grandeza, a pequenez da minha vida, mesquinhamente vivida. Um dia, aconteceu algo de grande, algo como uma celeste epifânia, como uma epopeia divina, e cruzou os caminhos cinzentos da minha vida, mas eu nada vi dessa grandeza, porque estava envolto da minha pequenez. Ninguém pode ver coisas maiores do que ele mesmo é. E continuei a esperar, a esperar pelo grande acontecimento da minha vida, que me redimisse da irredenção das minhas mesquinharias. 

E esse acontecimento não vinha, e minha vida cinzenta e monótona continuava no meio de coisas pequenas, pequeninas, pequeníssimas. Só mais tarde, muito mais tarde, depois de passar o deserto fastidioso, e as águas sanguíneas do mar vermelho, depois de ouvir o clamor terrífico das trombetas do Sinai, e ver relâmpagos de Deus sobre mim, e dentro de mim; só então é que entrei na terra de Canaã das coisas grandes da minha vida. E essas coisas grandes eram todas pequenas, medíocres, corriqueiras, triviais, como os seixinhos na poeirenta estrada - brancos, cinzentos e pretos, como punhados de areia anônima com que as crianças se divertem. Mas, eu aprendera a fazer grandemente as coisas pequenas... a revestir de amor e benevolência os pequenos nada de cada dia, a cingir de um halo de suave sorridência as nulidades da vivência comum, a colher um punhado de florezinhas humildes e colocá-las á cabeceira de um doente, a dizer umas palavras amigas a um aniversariante esquecido. Projetei a leveza e luminosidade do meu próprio eu, para dentro de todas as coisas pesadas e escuras, e eis que as coisas tristes falavam de alegria, e as coisas amargas sabiam a doçura, e as coisas incolores resplandeciam multicores...

Convalesci, finalmente, da velha doença crônica de querer receber e ser servido. Convalesci para a nova e vigorosa sanidade de querer dar e servir, dar do que tinha, dar o que era, dar do meu e dar o próprio eu. Desde esse dia, nunca mais vi coisas pequenas ao redor de mim, porque não havia mais coisas pequenas dentro de mim. Desisti de me fazer à imagem e semelhança dos objetos, e fiz todos os objetos à imagem e semelhança do meu Eu divino. E tudo era grande, divinamente grande.
Publicado na revista Serviço ROSACRUZ - junho 1982

“São as coisas pequenas que permitem realizar as grandes. Talvez isto estimule alguns membros a praticar o serviço”. (carta 81 do livro Cartas aos Estudantes, Max Heindel)

2 comments:

Anônimo disse...

Lindo...lindo..lindo. lendo, absorvendo, sentindo e seguindo...Obrigada irmã querida pelo texto postado! Aceite um grande abraço fraterno!

Maria Lázara Franzini disse...

Também a você, irmã e amiga, meu abraço amigo, obrigada por estar sempre presente nos comentários trazendo o "toque caloroso" da fraternidade.

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